A verdade, aquilo sobre o que nunca fui capaz de escrever foi sobre ser mãe. Foi sobre estar sempre a dizer adeus aos meus filhos. Porque isso eu não sei desrever. Porque isso não se conta. Como não se conta as vezes em que quis ser boa mãe e não pude. Porque fiz uma escolha e choro todos os dias sobre essa escolha, sobre perder, sobre não saber, sobre não os ver todos os dias. Isso é o despudor. Isto é um despudor com que conto para me conseguir pôr em pé todos os dias de manhã. Todops os dias em que não sei como ela vai para a escola, em que não lhe dei dinheiro para o lanche, em que não sei se tem frio ou calor. Porque os meus filhos, que são a melhor coisa que fiz na vida, vivem no Rio e eu vivo em Lisboa. O pior são as coisas pequeninas. São os silêncios que escolhemos ter porque sabemos que faltam 120 dias para voltar a estarmos juntos. E nunca mais estamos juntos. Nem nunca mais podemos chorar na frente uns dos outros sem achar que nos estamos a fazer um mal imenso. Os filhos são para estar com as mães. Todas as coisas que não vou ter oportunidade de lhes dizer. As coisas que já não me conseguem dizer. Os vestidos que não a vi usar, os braços dele e tudo nele que está um homem.
Quero dormir. Quero não chorar, quero ser adulta e aceitar-me e aceitar a escolha que fiz, o mal e o bem que lhes faço, saber que sabem que gosto tanto deles apesar do Oceano e de nunca mais os ter acordado para irem para o colégio. Podia continuar. Estou certa que o despudor é isto. Mas de nada me vale. Obrigo-me a parar. O despudor é isto: Viver todos os dias assim tão longe.
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